Theresa Catharina de Góes Campos

  PRENDA-ME SE FOR CAPAZ

Dirigido – e co-produzido por Steven Spielberg, "Prenda-me se for capaz" (Catch me if you can – EUA, 2002 – cor, scope, dolby - 141 min.) conta a história de Frank Abagnale Jr., consultor do filme, com roteiro inspirado em seu livro autobiográfico. Ótima diversão para adolescentes e adultos, tem como protagonista um jovem nova-iorquino que, durante três anos (de 1964 a 1967), antes de completar 19 anos de idade, já era procurado pelo FBI, por falsificar cheques, dando golpes de milhões de dólares, assumindo identidades falsas...e conseguindo escapar da polícia. Descontou quatro milhões de dólares em cheques falsificados! Atravessou os EUA, aplicando roubos e fraudes milionários, falando mentiras, com atitudes desonestas, mas despistando os policiais. Mestre na arte do disfarce, com apenas 17 anos se tornou um dos maiores falsários na história dos EUA.

"As pessoas só sabem o que dizemos a elas." (Frank Abagnale Jr.)

Esclareço aos pais e professores, psicólogos, orientadores vocacionais e pedagogos, que não se trata de mais um filme sobre a ambição e o crime premiados com a impunidade. Muito pelo contrário. É admirável como essa produção mantém o interesse do público, em clima de suspense, ação, romance, humor e drama até o fim, mesmo revelando, logo no início, que a lei alcançou o delinqüente, colocando-o atrás das grades. Foi detido pela primeira vez na aldeia francesa de sua mãe, MontRichard, no Natal de 1967, quando foi convencido pelo investigador do FBI, Carl Hanratty, a se render voluntariamente.

Nas primeiras cenas, ele está numa prisão em Marselha, França, no Natal de 1969. No dia seguinte, o policial conseguia trazer o jovem prisioneiro para os EUA, onde foi condenado a 12 anos em prisão de segurança máxima e isolamento.

"Não posso parar ( de lhe perseguir). É o meu trabalho." (diz-lhe o policial)

Destaques: temas (bem atuais!) e personagens; produção, direção, interpretação ( Leonardo DiCaprio, Tom Hanks, Christopher Walken e Martin Sheen); roteiro (Jeff Nathanson), fotografia (Janusz Kaminski) , trilha sonora; figurino (Mary Zophres); cenários que recriam o final da década de 60; montagem( Michael Kahn); apresentação criativa, divertida, dinâmica e original, dos créditos iniciais, valorizados de forma espetacular por imagens e sons ; início e desfecho do filme.

Sobre a beleza dos créditos iniciais:

"(...) animação que transporta os espectadores ao passado de comédias despretensiosas e é pontuada pelo jazz progressivo composto por Williams, inspirado nas orquestrações de Henry Mancini que dominaram o cinema americano nos anos 60 (sic)." (Marcelo Rossi, Correio Braziliense)

Indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante (Christopher Walken, intérprete de Frank Abagnale Sr., investigado por fraude contábil) e trilha sonora (John Williams, que reuniu suas partituras originais e sucessos de Frank Sinatra ), " Prenda-me se for capaz " em nenhum momento se mostra apelativo, nem violento, inclusive abordando com discrição as temáticas do adultério conjugal, alcoolismo e divórcio.

"- Você mentiu! (Frank Jr.)

- Às vezes, uma mentira ajuda a viver. Você entende bem disso." ( Carl )

Entre os aspectos da vida pessoal de Frank Abagnale Jr. e do investigador do FBI, Carl Hanratty (Tom Hanks), o mais pungente é a questão da importância da família, cuja ausência pode se transformar em condição traumática na vida de qualquer ser humano. O drama emocional de ambos está exposto na narrativa de forma inequívoca.

Seja como advogado (assistente de promotor público!), luterano (em família luterana), co-piloto de empresa área ou médico-residente (pediatra!), o personagem principal é muito bem interpretado – e com charme, aliás, exigido pelo papel – por Leonardo DiCaprio. Como professor de francês substituto, o jovem se vê enfrentando a descortesia de alunos indisciplinados... Entre os jovens de Atlanta, Georgia, ganha popularidade. E como sabia elogiar as mulheres!

Assistindo a programas e seriados de TV, Frank aprendia o vocabulário específico para seu desempenho em profissões diversas que, na realidade, não exercia.

Na década de sessenta, Frank Abagnale Jr., um adolescente normal, morava com seus pais em New Rochelle, Nova York. Até que a vida muda completamente, numa reviravolta provocada pelas dificuldades pessoais e financeiras dos adultos que lhe eram mais próximos e aos quais dedicava seu amor de filho. O pai, agraciado com a Medalha de Mérito do Rotary Club, perde os bens familiares, entre os quais a casa e o carro, por causa de seus problemas com a Receita Federal.

"Vou casar. Vou reaver tudo que tiraram de nós." (Frank Abagnale Jr.)

Pai e filho se tratavam com muito carinho. Mais tarde, o jovem Frank oferece ao pai, graças ao êxito de suas fraudes, um carro novo, insistindo, ainda, para que ele tente recuperar a esposa (interpretada pela atriz francesa Nathalie Baye). Quando o advogado lhe dissera, na ocasião do divórcio, que deveria escolher com quem viver – seu pai ou sua mãe – Frank Jr. se mostrara transtornado. Suas cartas ao pai eram freqüentes, esperançosas e bastante afetuosas.

"Jamais denunciarei o meu filho. Se você tivesse filho, você o denunciaria?"

O promotor de justiça (Martin Sheen) a quem o charmoso delinqüente pediu a mão da filha, percebe a situação.

"- Não sou nada, não sou ninguém. Sou apenas um rapaz apaixonado por sua filha.

- Não, você é um romântico como eu."

Observando a vida familiar de Brenda, o jovem trapaceiro se lembrava, de forma carinhosa, mas melancolicamente, de seus próprios pais. O advogado e a esposa lavavam os pratos juntos, após o jantar; conversavam, cantavam hinos luteranos.

Em sua festa de casamento, diz à noiva:
"- Não quero segredos entre nós. Nem mentir para você. Não sou médico, não sou advogado, não sou luterano. Não tenho 28 anos." E combina encontrar-se com ela no aeroporto, dali a dois dias. Cumpriria sua palavra a Brenda, se não encontrasse mais de cem policiais esperando por ele.
O jovem falsário decide viajar pela Europa. O investigador do FBI, alvo das brincadeiras de seus colegas, por conta do insucesso de sua perseguição implacável, ouve observações como:

"_ Se você, Carl, não o pegou aqui, não pegá-lo na Espanha."

O policial vai demonstrar uma capacidade enorme de compreensão, reconhecendo as circunstâncias do falsário adolescente e, apesar de ter sido enganado e humilhado por ele, dispõe-se a enfrentar todas as dificuldades para lhe estender a mão, confiando em Frank Jr., quando ninguém mais se importava com a sua vida. Agiu assim olhando para o ser humano, sem esquecer a habilidade demonstrada pelo jovem impostor, o que o qualificava para identificar fraudes de todos os tipos.

"– Como você fez para ser aprovado nos exames de Advocacia? O que fez para colar? Outra pessoa fez as provas em seu lugar? (Carl insistia em saber...)

 - Eu não colei. Estudei e passei!." (Frank Jr.)

O final do filme, a leitura dos créditos finais, registrando as vitórias da amizade, do amor e da capacidade humana de realizar o seu potencial...deixaram-me profundamente comovida: que história maravilhosa!

Nas palavras de Steven Spielberg: "Mostra que podemos transformar nossas vidas e sermos uma pessoa melhor."

Embora eu estivesse lacrimosa, meu coração saiu cantando da sala de cinema, entoando silenciosos hinos de aleluia.

Theresa Catharina de Góes Campos
 

Jornalismo com ética e solidariedade.